Diretor da Anvisa defende regulamentação da cannabis medicinal na Câmara dos Deputados

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BRASÍLIA O diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária ( Anvisa ), William Dib, defendeu a regulamentação do uso da cannabis para fins medicinais em audiência pública da comissão especial do projeto de lei de Medicamentos Formulados com Cannabis.

Durante sua exposição na Câmara, nesta terça-feira, Dib citou o aumento no número de autorizações judiciais para plantio e chamou de “balela” o argumento de que a autorização do registro de remédios e do cultivo controlado da maconha impulsionaria o consumo recreativo.

— Há muitos anos a classe médica tem prescrito a cannabis a seus pacientes, principalmente crianças com alterações neurológicas. Há cinco anos dava para contar dezenas de pedidos de plantio, passou para centenas e hoje calculamos milhares de autorizações judiciais que permitem o plantio — disse: — Ninguém discutiu quando autorizamos opiáceos como se discute a cannabis. São mais de 300 derivados do ópio registrados no nosso país. Qual será a alternativa americana para sair da crise de opiáceos vista nos Estados Unidos? Cannabis ativa, com efeito deletério próximo do zero e efeito de analgesia. É uma alternativa que a saúde pública tem que discutir. Não podemos fingir que não é com a gente.

A comissão especial foi instalada na Câmara no início do mês para discutir um projeto de lei de autoria do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE) para permitir a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da Cannabis sativa exclusivamente a pacientes que apresentem prescrição médica.

Dib criticou a visão de que a regulamentação do tema ocasionaria um aumento no consumo recreativo da droga. O diretor-presidente da Anvisa afirmou que o argumento é “balela” e defendeu que esse tipo de posicionamento fecha os olhos à realidade do país.

— Algumas pessoas desvirtuam o que a Anvisa está se propondo, dizem que o o plantio aumentaria a chance de uma convulsão de plantios não fiscalizáveis e de consumo da droga. Isso é balela. É só ler o projeto que vão saber que o plantio é extremamente seguro. Quem quiser fazer uso recreativo da cannabis vai na esquina (e consegue), não precisa assaltar uma plantação de cannabis. É mais fácil chegar num boteco da esquina e conseguir. Não podemos fingir que isso não é uma realidade — criticou Dib.

Na semana passada, a Anvisa começou a votar a regulamentação do uso medicinal da maconha na Diretoria Colegiada da instituição, mas a votação acabou sendo interrompida após pedidos de vista feitos por dois conselheiros, Antônio Barra Torres e Fernando Mendes Garcia Neto. Na ocasião, Dib, que é relator da matéria no órgão, votou a favor da autorização de medicamentos à base da planta e da permissão do cultivo da maconha, por empresas, para fins medicinais.

O tema está no radar da agência desde 2014, quando foram adotadas medidas para importação excepcional de produtos à base de Cannabis. De lá para cá, a maconha foi incluída na lista de plantas e substâncias de controle especial do Ministério da Saúde. A medida possibilitou o registro de medicamentos com derivados da planta, culminando, em 2017, no primeiro registro de medicamento à base de Cannabis no Brasil, o Mevatyl. Desde então, um grupo de trabalho vem discutindo sobre o cultivo de maconha para fins medicinais. Segundo a agência, desde 2015, mais de 7.700 pedidos de autorização excepcional para importação de remédios à base de cannabis foram atendidos.

No caso da autorização de medicamentos, a Anvisa exclui cosméticos e produtos fumígenos, ou seja, cigarros e afins, da lista de produtos permitidos. A norma requer ainda que a composição do remédio tenha percentual inferior a 0,2% de THC. Em relação ao cultivo, a agência estabelece que apenas empresas podem fazer o plantio e determina diversas regras para produção e transporte.

Presidente da comissão especial, o deputado Paulo Teixeira (PT- SP), questionou a possibilidade de a regulamentação como está sendo proposta pela Anvisa deixar de fora pessoas físicas e cooperativas que fazem o plantio para consumo medicinal. Esse é um dos principais questionamentos de entidades ligadas à defesa do uso medicinal da cannabis, que afirmam que as regras determinadas pela agência, como cultivo em lugar fechado e com rígido sistema de alarmes, entre outros pontos, tornaria inviável o plantio por essas organizações.

— Senti na normatização da Anvisa um vácuo entre o que moveu a regulamentação e como ela saiu. Me pareceu que por conta da preocupação sobre desvio de finalidade (do plantio), a Anvisa queira oferecer apenas um produto modificado por meio da indústria. Pareceu um vácuo no atendimento ao padrão de consumo medicinal no Brasil — disse.

De acordo com o diretor da Anvisa, a regulamentação de plantio por pessoas físicas extrapolaria as competências da agência:

— Fugiria da razão de existência da delegação legal que a Anvisa recebe. É muito diferente dessa casa, que faz a origem da lei. Não acho que é uma coisa impossível, mas nesse momento o que a Anvisa deve fazer é autorizar o plantio com a segurança outorgada. É muito restritivo? Sim! Severo ? Sim! Ninguém pode dizer que a gente está bancando o jogo de liberar o uso recreativo da droga. A Anvisa está cumprindo seu papel que é de regulamentar medicamento para população brasileira.

Autor do projeto de lei sobre o tema, o deputado Fábio Mitidieri (PSD- SE) argumentou que como está estruturada, a normativa pode abrir brecha para criar um monopólio de grandes empresas sobre a produção.

—- Espero que a gente não faça um grande negócio como esse parar na mão das grandes empresas e formar um monopólio. (Espero) que esses medicamentos possam estar no SUS, porque, hoje, quem tem dinheiro tem medicamento, quem não tem passa dor. Essa legislação tem o poder de salvar vidas literalmente. Faço apelo para que Anvisa se some conosco e faça uma legislação moderna, que possa preservar o lado do pequeno produtor — ponderou.

O Globo

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