Por Dr. Wilson Lessa, graduado em Medicina pela UFMS. Médico especialista em Psiquiatria e Psiquiatria Forense pela AMB. Professor efetivo do curso de Medicina da UFRR e colunista do portal Sechat
O dia internacional da pessoa com deficiência é comemorado no dia 3 de dezembro. No Brasil, a data também ficará marcada como o dia da regulamentação de produtos à base de Cannabis pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Tivemos algumas surpresas: com a saída do diretor Renato Porto às vésperas da 29˚ Reunião Pública da Diretoria da ANVISA, muitos duvidaram que o tema seria discutido ainda em 2019, o que poderia significar uma dupla negativa das consultas públicas, dado a saída do atual diretor da autarquia especial no próximo ano.
A aparente mudança de voto da diretora Alessandra Soares sobre a pauta do plantio também foi motivo de estranheza. E vale lembrar que como o placar do pleito do cultivo foi 3 x 1, caso ela tivesse votado favorável, ficaria 2 x 2 e com o voto de minerva do presidente William Dib, teríamos a aprovação deste item também.
Embora a regulamentação de ontem tenha suas imperfeições, apresenta aspectos para serem celebrados. Sem sombra de dúvida: é a melhor regulamentação em relação ao uso medicinal no mundo no momento.
Nos Estados Unidos a legislação em nível federal não permite a prescrição de produtos à base de Cannabis. No momento, 33 estados do Tio Sam permitem o uso medicinal, mas os médicos fazem tão somente uma recomendação de utilização (não prescrição) e para determinadas patologias (e que mudam dependendo do estado).
Também não se trata de medicamento e sim de um suplemento nutricional. O que se tem de medicamento é o Epidiolex®, feito de canabidiol extraído da planta purificado a 98% e dois “THCs” sintéticos que estão no mercado há mais 30 anos para indicações bem restritas.
Desse modo, quando a Anvisa cria uma categoria especial de produtos à base de Cannabis faz algo genial: por não ter o caráter ainda de medicamento, ultrapassa a barreira dos suplementos alimentares estadunienses e permite uma flexibilidade ímpar de prescrição aos médicos quando preconiza que em formulações abaixo de 0,2 % de THC deverá ser prescrito em receituário azul B (como o Rivotril®). E como primeira opção terapêutica para qualquer patologia que o médico julgar ter algum benefício, com anuência de um termo de consentimento livre esclarecido pelo paciente.
Acima de 0,2 % de THC, por sua vez, deverá ser prescrito em receituário amarelo A (como a Ritalina®) e com a característica do uso compassivo, como última alternativa ou em doenças terminais, também com a assinatura do termo de responsabilidade.
Dito isso, tenho tempo e disposição para ouvir as críticas legitimas sobre essa regulamentação deficiente, mas corajosa e de vanguarda. E o fato de acontecer no Dia Mundial dos Deficientes, destes que motivaram incialmente no Brasil a busca por alternativas terapêuticas nos derivados da maconha, é motivo pra festejar por um lado, mas ter a certeza clara de que há outros desafios pela frente.
Nesse aspecto, já passou a comemoração e é hora de perguntamos para o Ministério da Saúde e para o Congresso Nacional em termos alegóricos: qual seria a lógica de importarmos óleo de soja dos EUA, podendo produzir soja e fazer o produto aqui no Brasil? A melhor forma de comemorar é avançar!